julho 26, 2008

À JANELA DO FADO (Livro)

(continuação)

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Martinho Conde tem uma vida que tudo faz para que seja estável (aparentemente pelo menos), preserva a família como a coisa mais importante do mundo e procura nunca fazer nada que cause qualquer instabilidade.
Trabalha como litografo há muitos anos na mesma empresa, onde desfruta de um lugar de destaque. Remunerado acima da média consegue levar um padrão de vida razoável. Tem quatro filhos dos quais, apenas uma ainda vive lá em casa, continua a ter uma boa relação com eles e não está nada arrependido da educação que lhes deu, embora a mulher diga muitas vezes que lhes deu liberdade a mais.
Faz parte da direcção do Clube do Fado do Porto, onde é sócio fundador, do pouco tempo livre que dispõe, ainda arranja algum para este cargo, só porque gosta muito do fado e é um estudioso do seu fenómeno social como canção nacional. Possui uma razoável biblioteca sobre o tema, de onde vai extraindo elementos para as suas palestras muito apreciadas no Clube, nas chamadas “Quartas-feiras de Fado”, dia em que tem lugar no pequeno auditório, encontros com gente do fado e onde assistem as mais variadas pessoas interessadas nesta história fascinante da nossa canção. Por lá já passaram conhecedores reconhecidos, desde José Neves a Fernando Batista.
Foi mesmo numa quarta-feira dessas, que (em colaboração com da Casa do Fado e da Guitarra Portuguesa, com sede em Lisboa), se recolheram no Porto, assinaturas de apoio para a candidatura do Fado a Património da Humanidade.
Foi o Martinho que fez um protesto, junto da comissão designada para elaborar o projecto, para que se recolhesse assinaturas noutros pontos do país e não só em Lisboa. Tudo bem, o projecto era deles, mas a candidatura devia ser a nível nacional, não é só uma cidade, mas sim um país, que tem uma canção nacional que se chama fado que estava em causa.

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A ideia que foi acolhida com muito entusiasmo no meio fadista, depois da Câmara Municipal de Lisboa aprovar a proposta para o início da candidatura à UNESCO, para que o Fado fosse elevado à categoria de obra-prima do Património Oral e Imaterial.
Esta Câmara nomeou como embaixadores da iniciativa os fadistas Mariza e Carlos do Carmo, o que Martinho acha muito bem, pois são no momento os maiores embaixadores da canção nacional no estrangeiro.
A proposta está ser tratada com todo o cuidado, para que não aconteça como o caso da Argentina, que viu a sua candidatura sobre o Tango rejeitada pela UNESCO.
Enfim, tal como do Tango da Argentina ou do Flamengo em Espanha, o Fado está no momento a ter a sua consagração a nível mundial. Embora o Martinho não concorde nada, com o papel em que estão a embrulhar essa candidatura, onde diz: “Fado tradicional de Lisboa”. Francamente!...
Outro caso que no momento apaixona o Martinho e os amantes do fado em geral, é a aquisição pelo estado português, da colecção de discos de fados na posse do britânico Bruce Bastim. (*)
Como garantiu o secretário de estado da cultura, Mário Vieira de Carvalho, o valor desta colecção é de 1,1 milhões de euros e vai integrar o futuro museu da Música e do som, onde possui pessoal técnico específico para tratar este material.
Para o musicólogo Rui Vieira Nery, a aquisição deste espólio “é essencial para um melhor conhecimento da história fadista, nomeadamente nos primórdios da gravação fonográfica”.
Sara Pereira, do Museu do Fado, manifestou também satisfação por esta decisão do pelouro da cultura portuguesa e sublinhou como “fundamental para um melhor conhecimento da história do fado”.
A fadista Mariza, embaixadora da candidatura do Fado a Património Imaterial da Humanidade, disse sobre a colecção de discos: “é um sonho tornado realidade”.
A colecção de cerca de oito mil discos, inclui registos fonográficos efectuados entre 1904 e 1945, na sua maioria dados como perdidos. Além dos fados em si, são igualmente importantes do ponto de vista musical e etnográfico, os registos tardios de Maria Alice, Estêvão Amarante, Madalena de Melo, Maria Emília Ferreira, Ercília Costa, Berta Cardoso, António Menano, Edmundo Bettencourt, Armandinho, Alfredo Marceneiro entre outros menos conhecidos.

(*) Hoje, esta colecção já se encontra em Portugal.

Pág.5 (continua)

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