julho 29, 2008

À JANELA DO FADO (Livro)

(continuação)


Claro que a Mariza, não é uma nova Amália como muitos dizem.
Quando a Amália morreu, pelas exéquias que teve e pela aderência anónima e popular com que se revestiu toda a cerimónia, foi o maior funeral visto no nosso país e todo o povo, incluindo a juventude foi sensibilizada para o fado, daí, começarem a aparecer novas vozes a cantar temas que Amália imortalizou e que fez com que muita gente pensasse ter encontrado novas “Amálias”. Mas não, Amália só houve uma. A Mariza é a Mariza, como a Katia Guerreiro é a Katia Guerreiro e a Mafalda Arnauth é a Mafalda Arnauth.

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— Ora aí vem a Lucinda! Vou apresentá-la ao Albérico para que ponha a cantar estou ansioso por ouvi-la – Disse o Márcio erguendo-se da mesa.
— Fala-lhe do concurso, as inscrições ainda devem estar abertas — Disse-lhe o amigo.
De novo na mesa, os dois retomaram a conversa: – A minha opinião é que existiram sempre mais homens que mulheres a cantar, por isso penso que ser muito importante, aparecerem mais vozes femininas.
— Perdoa-me mas discordo contigo – retorquia o Marques – e podemos até fazer uma coisa muito simples: Numeramos uma folha de papel. Fazemos um traço na vertical de cima a baixo, de um lado dizes nomes de cantadores, do outro, eu digo nomes de cantadeiras (que aliás, era palavra que o Alfredo Marceneiro embirrava, porque dizia não existir o verbo “cantadar”). Vamos ver chegando ao fim, que lado do papel tem mais nomes… Aceitas o desafio?
— Vamos a isso, mas atenção, são só fadistas do norte e nomes, mesmo daqueles que já “partiram”, ok?
— Tira daí do teu caderno uma folha de papel, mas atenção amigo Marques, quem perder paga o jantar!
— Ok, diz lá primeiro.
E a lista (Como pode consultar nas últimas páginas deste livro), ficou assim…
(…)
Ora temos mais 45 homens a cantar, o resultado final fica então assim: 247 Homens e 202 Mulheres. O que dá no total: 449 o cantar fado no norte.
— Tirando o facto de ter que pagar o jantar, olha que a diferença não é muito grande, temos ainda que ressalvar, que decerto não nos recordamos de muitos nomes e outros nem conhecemos com toda a certeza. Em Vila do Conde, Póvoa de Varzim, Penafiel, Guimarães, Gondomar, Vila Nova de Gaia e mesmo até Aveiro, ouvi muita gente cantar fado que não me recordo dos nomes. Até porque nestas localidades, se não há, já houveram muitos locais onde se cantava fado.
— Mesmo assim, há mais homens que mulheres a cantar, se bem que nestas 449 vozes e depois de feita uma triagem, ficaríamos com: Um quinto de bons fadistas; Dois quintos de vozes razoáveis e agradáveis de ouvir; Os últimos dois quintos, são vozes sem valor algum, mas que gravitam no meio fadista, pelo muito amor que dedicam ao fado. Tenho razão Márcio?
— Não concordo totalmente, tens que ver que o fado é uma canção urbana, é uma canção do povo e o povo tem direito a tudo, até cantar como sabe e pode. Também sei que dentro dos preceitos tradicionais que o fado exige, existem muito poucas vozes com verdadeiro valor no fado, coerentes com aquilo que cantam, alheados de interesses económicos, cantando o que gostam e não o que calha, escrupulosos na escolha do seu reportório.
— Isso de interesses económicos… Temos que concordar que um profissional é disso que vive! Embora haja excepções, temos o caso do Fernando Maurício, que em qualidade era inegável e quantas vezes trocava um espectáculo bem remunerado, por umas horas entre amigos no fado vadio?
— Isso é verdade, mas infelizmente vê como foi a vida dele! Ou talvez tenha sido um fadista de valor até por isso… Se bem que foi sempre reconhecido como um “Um Grande Fadista” pelo povo que o cognominou de o “Rei sem coroa”.
— Bem, também foi reconhecido oficialmente, por quatro vezes: Prémio da Imprensa (1969); Prémio de Prestigio e de Carreira da Casa da Imprensa (1985/1986); Comemorações das Bodas de Ouro, em 31 de Outubro de 1994, homenagem promovida pela C. M. de Lisboa no teatro S. Luiz; E foi agraciado com o título honorífico da Comenda de Bem-fazer, atribuída pela Presidência da República em 12 de Maio de 2001.
— Já em 2003, depois de frequentes visitas de José Neves, Nelson Duarte e Manuel Barbosa, ao Fernando já bastante enfermo, José Neves, promoveu uma grande homenagem no Teatro Sá da Bandeira no Porto, com a presença de fadistas de Lisboa e do Porto, mas… infelizmente póstuma, pois Fernando Maurício, o maior fadista da sua geração, tinha falecido nesse mesmo ano a 15 de Julho.

Pág.8 (continua)

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